Por Roberta Danelon Leonhardt e Daniela Stump
A partir de 2012, as emissões de gases de efeito estufa liberadas
pelas aeronaves que decolem ou aterrissem no território da União
Europeia (UE) serão controladas. A medida objetiva atacar as emissões
globais ligadas ao setor aéreo, que se elevaram em 62,8% no período
entre 1990 e 2005, segundo dados da Organização das Nações Unidas
(ONU).
De acordo com a política europeia, qualquer companhia aérea, não
importa a nacionalidade, que opere no velho continente, deverá portar
permissões para emitir quantidade limitada dos gases causadores do
aquecimento global, conhecidos como gases de efeito estufa. Caso
emitam mais do que o devido, as companhias deverão investir na adoção
de tecnologias limpas em sua frota ou comprar permissões de emissões
no mercado de carbono europeu. Exceção será feita às companhias aéreas
não europeias baseadas em países que adotem medidas similares.
Cabe ao Brasil estabelecer estratégias que tirem proveito das
indústrias de aviação e de biocombustíveis.
Caso suas aeronaves sejam eficientes, emitirão menos gases do que a
meta imposta e poderão, assim, vender suas permissões para as
companhias aéreas que delas necessitam. Estabelecidas a oferta e a
demanda, estaremos diante de um novo ambiente de negócios bastante
promissor.
Os países em desenvolvimento, no entanto, já se manifestaram
frontalmente contra a adoção da medida europeia. Com razão, a
imposição de metas para o transporte aéreo vai de encontro com a
lógica adotada pela Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança
do Clima e pelo Protocolo de Kyoto, ambos assinados pelo Brasil. Os
tratados dividem o ônus da mitigação da mudança do clima entre os
países signatários e não por setores da economia. Ademais, de maneira
unilateral, a política europeia transfere para os países em
desenvolvimento parte das obrigações que deveriam ser arcadas somente
pelos países listados no Anexo I da Convenção-Quadro - basicamente os
países desenvolvidos.
O Protocolo de Kyoto prevê expressamente que são os países do Anexo I
que devem reduzir as emissões advindas da aviação, por meio de
processo multilateral a ser conduzido pela Organização de Aviação
Civil Internacional.
Dessa forma, merece destaque a existência de argumentos jurídicos
contundentes para se questionar a medida europeia também sob o ponto
de vista do comércio internacional. A imposição de custos adicionais
às companhias aéreas, com base na emissão de gases de efeito estufa,
tende a onerar de forma desigual a companhia que decola de países mais
distantes da Europa e aquela que faz percursos menores. Contudo, tendo
em vista que os serviços prestados por ambas as companhias são
similares, a restrição comercial pode ser entendida como uma
discriminação arbitrária ou injustificada entre países frente às
regras basilares da Organização Mundial de Comércio (OMC).
Por outro lado, a UE poderá alegar que a medida é necessária para
proteção da saúde e da vida das pessoas, ou mesmo essencial para
conservar recursos naturais esgotáveis, na linguagem das regras de
comércio. Contudo, será difícil para o bloco regional sustentar medida
unilateral contrária a uma convenção ambiental assinada pela quase
totalidade dos países do globo.
Ampliar imagem.
Enquanto as retaliações comerciais não vêm, cabe aos empreendedores
brasileiros estabelecerem estratégias que tirem proveito de duas
indústrias muito fortes no país: a de aviação e a de biocombustíveis.
Empresas e universidades brasileiras já se deram conta de que investir
em inovações tecnológicas que reduzem emissões associadas ao
transporte aéreo é um bom negócio.
Iniciativas que explorem combustíveis alternativos à gasolina e ao
querosene de aviação serão valorizadas não só pelos seus benefícios
ambientais, como por suas vantagens econômicas. Estima-se que cerca de
20% dos custos operacionais da aviação sejam destinados aos
combustíveis. Ainda, o desenvolvimento de novas opções mais econômicas
tende a ganhar rapidamente espaço no mercado.
Contudo, as oportunidades de negócio não giram apenas em torno das
energias renováveis. Em realidade, a Organização de Aviação Civil
Internacional prevê que apenas 10% das aeronaves utilizarão
biocombustíveis em 2050, devido a fatores limitantes, como escassez de
terra agricultável para o plantio da matéria-prima necessária para
gerar todo o combustível consumido pela frota aérea internacional.
Dessa forma, a solução passa também pelas inovações tecnológicas que
lidam com a eficiência energética das aeronaves, a partir da alteração
de seu desenho e do desenvolvimento de materiais que a deixem cada vez
mais leves.
Os Estados Unidos, grande consumidor de combustíveis para aviação
civil e militar, também despertaram para a necessidade de diversificar
a matriz energética aérea. A visita do presidente Barack Obama, ao
Brasil, em março de 2011, propiciou a assinatura de termo de
cooperação entre os dois países para desenvolver um ambiente favorável
para iniciativas acadêmicas e empresariais voltadas para a inovação em
biocombustíveis de aviação.
O acordo Brasil-EUA menciona expressamente o apoio à Aliança
Brasileira para Biocombustíveis de Aviação (Abraba) e à sua irmã
norte-americana Iniciativa de Combustíveis Alternativos para a Aviação
Comercial (CAAFI). As associações reúnem produtores de
biocombustíveis, pesquisadores, fabricantes de avião e companhias
aéreas.
Resta claro que a movimentação em torno desses novos negócios sinaliza
que alguns empresários aprenderam a lição com a UE: a adoção de
políticas ambientais de vanguarda é sempre mais lucrativa se
acompanhada do desenvolvimento e da exportação das tecnologias verdes.
Roberta Danelon Leonhardt e Daniela Stump são, respectivamente, sócia
e advogada do escritório Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados
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